Hoje proponho-vos uma reflexão sobre o consumo.
E porquê?
Aproxima-se a quarta sexta-feira do mês de novembro (este ano no dia 27) e esta data é, para muitas marcas e consumidores, sinónimo de Black Friday. Para outras (cada vez mais) assinala-se a Green Friday.
Começando por contextualizar…
A Black Friday surgiu nos Estados Unidos da América em 1953. A data (logo a seguir ao Dia de Acção de Graças), tinha como objetivo promover as compras relacionadas com a época Natalícia. O estímulo ao consumo seria feito com recurso à oferta de descontos especiais.
Este conceito (que entretanto se espalhou pelo mundo), já não se limita à sexta-feira. É possível vermos referências a descontos durante toda a semana (Black Week) e/ou mês (Black November).
A data é controversa, pois é quase impossível não ser associada a um tipo de consumo desenfreado, feito por impulso, de bens que muitas vezes nem são necessários, e que gera desperdício.
Com o intuito de estimular a reflexão sobre os hábitos de consumo, e avaliar o impacto que estes têm no meio ambiente surgiu (há alguns anos), em França, o movimento Green Friday. O objetivo é que o ato de consumir seja cada vez mais responsável, consciente e sustentável.
Sobre comércio
O comércio é uma atividade económica, e está situado entre a produção e o consumo. O termo deriva do latim commercium e refere-se à negociação que ocorre durante a compra/troca/venda de bens, mercadorias, serviços, valores, etc.
Desenvolve-se quando os povos nómadas se tornam sedentários e começaram a trocar os excedentes da sua atividade agrícola por outros produtos, com povos vizinhos. Esta troca espontânea de bens faz circular as mercadorias e fomenta o intercâmbio cultural.
Se a troca começou por ser direta (troca de bens por bens), com o surgimento do dinheiro passou a indireta.
Sobre consumo
Adquirimos e utilizamos bens e serviços de forma a satisfazer necessidades.
Foram vários os autores que ao longo dos tempos deram o seu contributo para a classificação e hierarquização das necessidades humanas (quem não conhece a famosa pirâmide de Maslow?).
De uma maneira geral (e apesar das diferenças que as várias teorias apresentam entre si), é possível dividirmos as necessidades humanas em dois grandes grupos.
Há necessidades que são indispensáveis à vida (necessidades básicas ou primárias) e a sua satisfação assegura, portanto, a nossa sobrevivência e bem-estar físico. Outras há que, embora não sejam indispensáveis, são necessárias, e delas depende o nosso bem-estar mental e emocional (necessidades secundárias).
Há ainda quem defenda a existência de um terceiro grupo. Neste, as necessidades seriam supérfluas, inúteis, desnecessárias, ou de ostentação (terciárias).
E quando é que o consumo se transforma em consumismo (consumo patológico)? Quando se refere à aquisição de mais bens do que aqueles que são necessários (quantidade)? Ou quando se refere a uma compra por impulso, de bens sem utilidade (ou que não se justifica pelo baixo o nº de vezes que serão usados)?
Ainda que muitas vezes não tenhamos consciência disso, o ato de consumir acarreta consigo responsabilidades de ordem económica, social e ambiental.
1. Económicas
Desde logo porque o consumo estimula a produção dos bens procurados (a procura é indispensável à produção).
O consumidor tem aqui um papel fundamental uma vez que condiciona o tipo de produtos produzidos.
2. Social
Uma vez que tem consequências que podem ser benéficas ou prejudiciais para nós, enquanto indivíduos ou sociedade (podem estar relacionados com o trabalho infantil, com o respeito pelos direitos dos cidadãos, etc.)
3. Ambiental
Pelo impacto que este pode ter no meio ambiente.
Seja porque leva a que se esgotem os recursos naturais (Dia da Sobrecarga da Terra – Earth Overshoot Day). Seja porque contribui para o aumento da poluição, ocorrência de alterações climáticas ou perda de biodiversidade, entre outras.
E aqui somos confrontados com a noção de consumo consciente, responsável ou sustentável…
E em que consiste?
No concreto, nas nossas ações do dia a dia, atrevo-me a dizer que não há uma resposta certa. O que faz sentido numa situação poderá não fazer noutra. No entanto, há questões que nos podemos colocar antes de fazermos uma compra:
– Preciso ou quero mesmo este produto (vou estimá-lo e usufruir dele)? Ou pelo contrário estou apenas a acumular bens que não vão ter utilidade, e que acabarão por ser descartados?
– Estou a comprar apenas a quantidade de que necessito?
– Estou a comprar produtos que vou poder usar durante muito tempo, ou muitas vezes?
– É possível reparar o produto, ou vai acabar no lixo?
– Qual a origem das matérias primas? Como foram produzidas, extraídas, transformadas ou transportadas? São orgânicas, ecológicas, recicladas, reaproveitadas ou reutilizadas?
– Os processos de fabrico são sustentáveis? Referem-se a produções de pequena escala ou edições limitadas?
– A produção é local?
– O produto respeita o ambiente no que diz respeito ao consumo de água e energia necessárias à sua produção?
– Que impacto têm no ambiente os transportes? Qual a pegada de carbono?
– E a embalagem, que quantidade de resíduos vai gerar?
Estas são apenas algumas das muitas perguntas que poderiam ser feitas.
No caso concreto da joalharia, o que motiva a aquisição de uma peça?
Será o preço? A oportunidade?
O valor material? O status?
Será a qualidade? A exclusividade?
É o facto da peça poder refletir a nossa personalidade?
Identificamo-nos com os valores da marca?
Partilhamos da visão do artista ou agrada-nos a sua abordagem estética ou conceptual?
A propósito deste último ponto, importa aqui relembrar que a origem da arte se confunde com a própria origem do Homem. A arte surge da necessidade que este tem de se expressar e é fruto da sua relação com o mundo. É através dela que o Homem comunica as suas necessidades, sentimentos, medos, desejos…
Se esta necessidade de criar surge, de forma ativa, no artista, é na forma passiva que se revela no observador/contemplador, na pessoa que adquire e usa a peça. Esta necessidade de consumir criatividade (a beleza produzida pelo homem seja na forma de som, palavras, cores, formas ou expressões corporais) foi também identificada como uma necessidade humana.
Como conclusão fica a ideia que, deixar de consumir não é uma opção (é necessário e até desejável). Mas refletir antes de comprar e decidir fazer melhor escolhas, é.
Como consumidores podemos ponderar comprar menos, mas melhor. Optar por produtos de melhor qualidade, e que durem mais. Adquirir produtos de que necessitamos ou que apreciamos mesmo. Produtos que vamos estimar, cuidar, preservar e usar durante muito tempo. Produtos ou bens aos quais nos ligamos afetivamente…
Comprar de marcas que têm essa consciência e postura, fortalece-as.
Contribuir para que os recursos sejam utilizados de forma mais eficiente, de forma a satisfazer as necessidades de consumo tendo um menor impacto ambiental, social e económico, está ao alcance de cada um de nós.
Considera este tema interessante? Deixe a sua opinião nos comentários.
Deixo-lhe ficar mais uma questão: Que fatores considera antes de adquirir uma joia?…
Ana M.
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